terça-feira, dezembro 05, 2006

Acorda

A corda seria a solução. Concordamos que isso seria um enorme clichê barato, mas nesse caso, isso deixaria de ser. Acordar seria a solução, mas aí a solução certa a tomar. Embora "acordar" também esteja na categoria "clichês", esse é mais um caso que não se encaixaria. Repetição também é clichê. Ficar repetindo as coisas é um método fácil para transmitir uma idéia que se quer fixada na mente das pessoas que lêem, mas no meu caso, no caso dessa idéia toda, não seria mais um clichê, já que a idéia que eu estou escrevendo só entrará na mente de uma pessoa.

A minha pessoa.
Acorda.

Todas as palavras dele não passam de cordas. Cordas fatalmente enleadas para lhe confundir. Simples assim. Precisa parar de querer desenfiá-las, para que pare com essa bobagem romântica que, sim, você pensava que um dia funcionaria. Mas não vai. Nunca funcionou. Acordar é a situação mais tensa que poderá ter, e que vai ter que passar. Tensa como ficava ao ler as cordas dele que não eram, nunca foram suas. Simples assim. Mesmo. Mesmo, mesmo. Ele sempre soube como tem o dom das cordas, um exímio escoteiro, embora muito maior que isso. Mas não é sua função desatar os nós dele. A sua função, agora, é acordar e viver, usando a sua corda para confundir, apaixonar e refrescar a cabeça das pessoas que ainda estão entrelaçadas nas cordas de quem não as quis nunca enrolar.

sexta-feira, dezembro 01, 2006

Quem eu sou

...

Hoje talvez...?

Então.

Eu deixo de ser muito (humpf!) e sou aproximadamente a pessoa que vocês pensam que eu sou quando me vêem mas...

ah nãooooo (!)

lá no fundo eu quero ser...

- Uma formiga!!!!!

Assim eu viveria num formigueiro e passaria......

"óóóhhh o dia inteeeeeeeeeiro"

......comendo açúcar! O que me faria sempre me lembrar só das pessoas que eu gosto.

segunda-feira, novembro 20, 2006

Conversa de palavras repetidas, podendo ser, além disso, certo processo psicológico de espelhamento

(Efêmera troca risonha, não duvidosa pois veio de ambos lados, de duas espontâneas palavras estimulantes, possuindo talvez sentido ambíguo na mente de quem lê)

A Moça:

- Vamo lá!

O Homem:

- Vamo lá.


_______
(o texto não deve ser interpretado como algo patético, diga-se de passagem)
-participação especial: marcelo camelo-
-17.11.2006-

segunda-feira, novembro 06, 2006

Conservatório

Esse dia úmido há tempos não existe.
A flor do jacaradá, fresca na calçada,
me avisa sobre o lugar que de alguma maneira
(além dos cheiros e da temperatura)
me faz voltar àquela tarde de uns anos atrás
quando eu ainda era apenas curiosa,
laço rosa,
soprando velas...

... Lento...

Essa placa de casa me diz nada além do nome
(cujo o sentido eu não sei)
ela somente traz a dúvida do que seria.
Eu espio como sempre e pela janela vejo
um menino tocando seu mudo violino
porém isso ainda não me responde
aí sinto permanecer
o meu leve flutuar...

... Sopra...

Passa o velho com seu cigarro
(fumaça de palha)
guiando o ar para outra vez
me levar
àquela mesma tarde
donde eu sempre
me sinto
segura em estar.

quarta-feira, outubro 25, 2006

O Pequeno Príncipe na Solanolândia

O nosso querido Antoine, enquanto escrevia “O Pequeno Príncipe”, estava muito preocupado em ilustrar o mais fielmente possível todas as imagens que ele gostaria que conhecêssemos ao ler a sua história. Ele ainda gostava de desenhar (embora algumas pessoas grandes não tivessem o estimulado quando era criança, dizendo que o seu desenho número 1, o de uma jibóia com um elefante dentro, não passava de um chapéu), e dedicou muito do seu tempo à tal tarefa, tanto tempo que acabou se esquecendo de alguns detalhes importantes que aconteceram no meio da jornada do pequenino Príncipe.

Vocês devem perceber que é muito estranho que ele tenha se esquecido de tão importante fato e que esse caso venha a ser contado só agora, nos anos 2000, quando muitas pessoas já não prestam tanta atenção nos livros. Porém, sei que na mesma medida em que vocês percebem isso, vocês sabem que isso não é tão estranho assim, afinal, nós eternas crianças, às vezes achamos muito mais divertido desenhar, já que escrever se torna tão chato de vez em quando e, com certeza, vocês não acharão difícil encaixar esta parte da história na história toda. Mas eu penso, assim como Antoine pensaria, que talvez alguns adultos terão dificuldades em fazer isso. Os adultos adoram números, números de páginas e de páginas na ordem correta. Os adultos são estranhos.

Pois bem. Aconteceu assim:

Quando o Antoine estava aquarelando o desenho do geógrafo (do sexto planeta que o Pequeno Príncipe visitou), ele começou a ficar ansioso para narrar todas as maravilhas e todas as coisas que o aborreciam na Terra. Assim, ele pulou direto a esse capítulo, nos mostrando que ele deveria ter um sério problema de memória, já que não narrou a rápida, mas nem por isso menos importante, passagem do Pequeno Príncipe pelo sétimo dos oito planetas visitados por ele. O nosso Antoine lembrou da passagem só após o livro ter conquistado grande sucesso com o público. Ele a escreveu e depois a deu para mim, enquanto eu passava com o meu balão em cima da sua casa. Ele me disse que não sabia porquê não havia colocado a passagem nas novas edições do livro e, antes que a colocasse no lixo, decidiu passá-la para mim.

Acho que isso aconteceu porque o Antoine já estava velho e, no final das contas, ele já era bem adulto quando escreveu a história do Pequeno Príncipe. Os adultos adoram números, números de páginas e de páginas na ordem correta. Os adultos são estranhos.

Então eu vos escrevo agora a parte que faltava:

A Solanolândia foi o sétimo planeta que o principezinho visitou. Chegando lá, ele encontrou uma grama muito verde e vistosa, uma mesa com um telégrafo em cima e uma cadeira aonde um homenzinho telegrafista vestido com uma camiseta azul e calça jeans estava sentado. O pequeníssimo planeta era todo coberto pela grama e, assim que o Príncipe colocou os pés nele, o telegrafista falou com desespero:

— Não pises na grama! Bem-vindo a Solanolândia.
— Solanolândia?
— Sim, Solanolândia. A terra do Solano.
— E aonde está o Solano?
— Bem aqui. É o meu ego.

O principezinho arqueou as suas sobrancelhas douradas e perguntou:

— Porque eu não deveria pisar na grama se o planeta inteiro é coberto por ela?
— Por que ela está cheia de formigas. Se tu ficares pisando por aí, tu irás acabar com várias delas...

O principezinho não se mexia mais. Enquanto operava o aparelho freneticamente, o telegrafista continuou:

— E aí haveria muitas famílias de formigas sem pai, sem mãe, sem os irmãozinhos...

Houve um breve silêncio.

— E o que fazes nessa máquina?
— Eu escrevo histórias.
— Que tipo de histórias?
— Eu escrevo histórias sobre minha vida e sobre a minha relação com as formigas.

O Pequeno Príncipe sorriu.

— Mas que relação tu terias com elas se tu não podes levantar dessa cadeira para pisar na grama?
— Eu espero elas virem até mim, subirem pelas pernas da minha mesa ou da minha cadeira. Sabe, elas me incomodam às vezes, me dão coceira e me picam. Elas costumam passear pelo telégrafo e depois descem para a grama novamente.
— Tu conversas com elas?
— Elas vêm aqui e depois voltam para a grama. Sempre.

Sendo a resposta não satisfatória, o principezinho repete a pergunta, já que nunca desiste da resposta após tê-la feito:

— Tu conversas com elas?
— Não. Elas são só formigas e elas não falam.

O Príncipe, aborrecido, suspirou:

— Então para quem tu escreves histórias?
— Para os homens.
— Porque tu escreves histórias para os homens?
— Para eles terem vontade de me conhecerem melhor.

Fez-se um silêncio mais duradouro que o anterior.

“Solitário, mesmo, é estar na Solanolândia”, o Pequeno Príncipe pensou. “Não adianta ele escrever histórias para os homens pois eles jamais poderiam pisar na grama do seu planeta. Ele não consegue sequer criar amizade com aquelas formigas que estão sempre interessadas em ajudá-lo em suas histórias, pois ele pensa que elas apenas estão ali para lhe provocar coceiras”.

E no mesmo pé que pisou na Solanolândia, o principezinho voltou a continuar sua viagem, repetindo a si mesmo “As pessoas grandes são realmente esquisitas”.

segunda-feira, outubro 02, 2006

Ótimo de Verdade

- Eles estão olhando?
- Não, eles estão de olho naquela kombi, fica tranqüila.
- Tá... em baixo da árvore!

Dá uma cuspida na mão, espalha dos dois lados.

- Uhm-hum... Não tem problema, o vento tá soprando pra lá.
- Quer?
- Não.

E elas entram na festa. Felizes, felizes. O dia dela tinha sido ótimo, tinha colocado os trabalhos em dia, tinha esquecido que sofria e já fazia um tempo que não se sentia tão calma. Caminhou muito e a noite estava tão macia que tinha a impressão que nada daria errado.

Como é simpática! Todos queriam saber como ela estava, se o seu coração tinha aceitado bem mais um pouquinho de cola, essas coisas. Estava até brincando, dizendo que da próxima vez ela vai usar esparadrapos e que estava desenvolvendo uma poção de cura para rachaduras no peito.

Mas então... "caaaaaaabroooooooooom".

- Ah! Eu não estou acreditando.

Tudo. Tudo o que ela não queria, alí, materializado num só corpo. Esse é o tipo de coisa que a gente, gente normal, não entende por quê acontece. Tantos lugares, tantas festas, tantas cidades, tantas vias-lácteas! Mas acontece, né? Parece que as coisas vão acabar bem... bom, acho que já acabaram:

A amiga tinha desaparecido. Perdida, tudo começou a girar e o moço ainda teve o discarate de ir puxar assunto, como se fossem os melhores amigos do mundo. Está tudo bem. Tudo bem mesmo. Não há nada de errado. Não, não. Tudo está tão bom e divertido, isso é divertido, olha só que legal... de verdade.

- Vou alí, já volto.
- Mas aquela música...
- Vou alí, já volto.

É verdade, tudo anda tri bem, o dia dela tinha sido ótimo, tinha colocado os trabalhos em dia, tinha esquecido que sofria e já fazia um tempo que não se sentia tão calma. A noite estava linda lá fora, e ela não ia chorar. Não ia mesmo. Com certeza! Pra quê? Não tinha um porquê. Tudo estava maravilhoso.

Senta na mesa. Uma outra amiga aparece e vê a qualidade do lápis preto delineador da Avon.

- Tu tá bem?
- Não.
- Eu percebi, ele tá alí do outro lado.

"Pronto", ela diz, enfim.

quarta-feira, setembro 27, 2006

Pequeno Mês

Cortinas dançando
o vento soprando pela minha janela
a força vinda de você
de tão longe.

Há certa melancolia em seus olhos
o tempo todo e
é pesado a sua volta mas
só um pouco escuro.

A mesma melodia para nós enquanto
eu estiver soprando pra lá.
Mesmo não pensando nisso.

As coisas funcionam e acontecem
sempre por seus meios.
E a gente nem pensa nisso.

terça-feira, agosto 22, 2006

Vontade de ir além

Chovia muito. Não queria aparecer, mas foi. Viu alguns vultos naquela sala escura. O chão era de metal, prateado, os seus pés passavam pelas frestas onde mal conseguia se equilibrar.

Pegou um trem. As pessoas eram só passos. Por um longo tempo a procurou. A menina dos seus sonhos. Tudo continuou balançando. Parou. A vontade de ir além doía. Doía nas mãos.

Isso é um costume que não consegue se livrar. Assinou assim o nome dela, pra se esquecer de vez.

sexta-feira, julho 21, 2006

Conselho do Vento

Por andar triste a pensar
com o que poderia
o nome dela rimar
entre janelas tempo, o ar
sábios continuam a soprar:
"O nome precisa ser
sim colocado em ímpar lugar"

Mas lhe mantém surdo o pesar
do seu infortuno passado chorado:
nunca soube como se deixar levar.

segunda-feira, junho 12, 2006

Tempestades

vinho logo acaba e
andar pela chuva nos cabe
adormecer na areia ou
em teus braços não
faz diferença
voltar pra casa com
o meu guarda-chuva já sei
esperar essa água
toda evaporar
do que me sempre sobra
de bom é só o sonhar.



-12.06.2006-

quarta-feira, maio 10, 2006

E... Corta!

Mas che barbaridade de tarde enjoada.

Pra minha sorte, Elisa está ao meu lado sem o moleque.

Fico meio desajeitado com a maneira que ela me trata às vezes, me faz sentir um piá quando me convida pra tomar uma bebida e, sabendo da minha situação, me olha com aquele jeito de patroa quando tá pagando a conta.

A conheci na biblioteca, ela lia um livro sobre plantas enquanto eu fingia procurar um dicionário de inglês.

Agora, trinta e nove dias depois, estamos indo àquele bar que costumávamos ir aos sábados...

Hoje é sexta-feira!

Essa mudança na nossa recente rotina provavelmente aconteceu por causa da Naná. A conheci antes de Elisa, numa dessas festas que as pessoas deixam de comer camarão em casa só pra ver o que e quem estaria lá. Naná me beijou e não quis meu número.

Sim... como todo homem que se preste, eu tomei o caminho mais fácil: Elisa adora me controlar. E aqui, sentado na frente da Elisa numa sexta-feira ao invés de um sábado, uma idéia bonita de Naná soprou entre meus olhos e a cabeça morena dela. Naná me faz evaporar na direção da estrela mais distante quando toca minhas costas com seus longos dedos finos e também me faz sucumbir ao lugar mais escuro do seu corpo quando beija segurando-me pelos cabelos...

- Vamos?
- Sim... sim, vamos. Mas eu pago a conta hoje.

Elisa pareceu surpresa e não recusou a oferta. Levanto-me e... lá está Naná. Alva e brilhante, encostada na porta, me olhando e dando forças para prosseguir com a sua pequena idéia bonita mas, a cada mesa que contorno em direção ao caixa, essa força se esvaece com a visão que tenho das sedosas madeixas de Elisa, ondulando junto às suas ancas. Além delas, já até ganhei a confiança do guri... e isso me custou várias tardes fingindo ser um pônei na casa da mãe da Elisa.

Cristo! Tenho que ser homem!

- São 18 reais.

Tenho que quebrar o encanto. Passo a nota de 20.

- Seu troco.

A voz do senhor sôou como uma dádiva, e até Naná não pode conter sua emoção. Procuro o rosto de Elisa e ela, que já absorveu a imagem, fala antes que eu abrisse meus lábios:

- Tenho que ir pra casa, ajudar o João Pedro a fazer o tema de Ciências.

Ela me dá um último beijo na testa e sai leve pela porta.

Naná me olha e eu pego suas mãos para beijar. Ela sorri seu sorriso de princesa e me leva ao seu lugar, transformando-me em rei ao me fazer perceber que, quando estamos a sós, eu apenas a faço sentir um pouco mais velha, como toda mulher feita como ela deve quando está prestes a fazer um jovem homem como eu ficar um pouco mais sábio.

segunda-feira, abril 10, 2006

Tarde Cheia

Ela estava com ele,
finalmente apenas com ele.
Seu coração estava batendo leve,
como se uma nuvem de suspiros tivesse
pairado
sobre seu peito.
Cada movimento dos braços finos
de seu amado
era calculado pelos seus olhos,
onde tentava
julgar
o que ele estaria pensando
ao envolvê-la ou
deixá-la
na poltrona aconchegante
do cinema.
O cheiro dele a preenchia ternamente
com um profundo
sentimento que a fazia
inspirar devagar toda
vez
que ele a espiava
com o canto do olho.
Sorrisos.
O seu nariz procurava o dele, e
ela imaginava
se ele gostaria de um
beijinho de esquimó.
Disseram que nunca haviam
percebido
uma relação
tão
meiga
entre
dois amigos...
Sim.
"Apenas dois amigos",
ele disse.
E como Alice dispertando
do seu
sonho,
a parte sobre os
olhos dela
começou a saltar.
Seu maior consolo foi o
pensamento de que
aquela
não era mais uma
das suas
tardes vazias.



-02.01.2006-

sexta-feira, abril 07, 2006

Aline e Vampiro

Aline...
Aprisionada por um Vampiro!
Vampiros com seus sorrisos em sangue
facilmente enfeitiçam a mente da
fascinante Aline.
Eles a obrigam mastigar
seus próprios lábios,
fazendo ela sentir o gosto de ferro entre
seus próprios dentes.
Delicioso!
Como os dentes de Vampiros no
seu alvo pescoço à meia-noite.
Ela se tornou um deles, afinal.
Tecidos empretecidos moldando suas curvas,
espantando todo homem de bem.
Pensa em como seduzir Vampiro,
dando reviravoltas com suas pupilas infinitas e
demoniacamente lustrando o lábio de cima.
Vampiro dirá:
- "Eu não gosto de você, Aline".



-28.03.2006-

O Jogo #2

Dama de Espadas luta pelo que deseja.
Dama de Paus não precisa se empenhar.
Dama de Ouros já tem o que precisa.
Dama de Copas chora pelo que foi.

Valete de Espadas corta o coração de cada uma.
Valete de Espadas não sabe o que faz.
Valete de Espadas parece querer algo mais.
Valete de Espadas, hoje, descançará em paz.



-25.01.2006-

Passos

Muito mais simples era o amor, pra ele, quando era criança.
Chegava a hora do recreio, gastava toda grana do lanche
em pirulitos que ia distribuindo esperançosamente a todas meninas.
Pra não parecer tão babaca, dava com muito mau gosto a
alguns meninos também.
Sem chamar muita atenção, chegaria no grupinho lá do canto
onde sua adorada estava.
Os códigos eram muito simples.
Se estivesse com sorte, ela ofereceria um teco do doce que ganhou
a ele, com a boba desculpa do... agradecimento.
Ele ficaria extasiado de pôr sua boca naquele restinho de saliva.
Pronto.
O selinho seria inevitável na hora de correrem pra formar a fila
e sentariam juntos na aula de ciências.
Sonharia com ela à noite e torceria para encontrá-la
no caminho da escola.

Complicado parece ser o amor, pra ele, agora.
Chega em casa à noite, dá ração pro Bob, liga o monitor e
começa a digitar coisas vazias sobre a vida na esperança de que alguém ache interessante.
Conheceu essa garota ao acaso.
Agora se sente tonto toda vez que está ao lado dela e,
talvez por criancice,
não consegue decidir o que fará da vida.
Se ela tem outro ou não, ele não se prenderia a alguém tão... facilmente.
Quer aproveitar a liberdade.
Poderia também convidá-la para jantar no japonês porque
no fundo ele quer se render e a garota
muito gosta dele e das tolices que ele diz e teima em escrever.
Mas ele finge não perceber.
Simplesmente vai dormir e reza pra que tudo passe logo.



-17.01.2006-

segunda-feira, março 27, 2006

O Encontro

Quinta-feira. Estamos entrando numa casa antiga, no centro ou em qualquer outro bairro dos arredores da amada Porto Alegre. Cidade Baixa, de preferência. Ela é alugada... bem, talvez. Podemos sentir o pó entrando em nossos pulmões e o cheiro do mofo é sensual nesse momento.

Percebemos que no final desse corredor há uma pequena sala de jantar. As louças estão postas sobre a mesa. Pratos. Copos de cristal. Talheres com o brilho da prata. Candelabros sem velas. Só há duas cadeiras... ele sabia que estaríamos aqui. Provavelmente ateou fogo nas outras. O dia ainda está claro, devem ser umas dezesseis horas, talvez dezessete. Uhm-hum... são extamente dezessete e cinqüenta e três, segundo o cuco da parede aonde também está pendurado um imponente espelho, refletindo toda tua curiosidade.

Todas as luzes estão apagadas. Não por opção, creio. Tudo parece marrom. Bege. Amarelo. É... quase tudo tem cor de tabaco e está iluminado pelos raios de sol que penetram através daquela cortina que o vento está soprando, de leve, em nossa direção. A escada que subiremos agora também tem cor de tabaco e o final dela é escuro. Fico tonta com escadas em caracol e dias meio mornos como este.

Enxergamos cinco portas. Cinco diferentes aventuras. Não sou boa com probabilidades reais e eu tenho que acertar a porta que não nos acusará de intrusos. Seguirei minha intuição e entrarei na porta que é a do banheiro. Quero ver quais porcarias ele toma.

As toalhas estão totalmente secas, a pia também. A tampa da privada está fechada e não há cheiro algum além do sândalo que vem do cesto que acabei de abrir para ver o que haveria dentro. Havia sândalo, e só. A banheira está manchada e o chuveiro é de metal. Vários sabonetes estão espalhados pelos cantos e nenhum foi recentemente aberto.

Nenhum remédio. Ele os esconde. E para minha surpresa a escova de dentes é nova. Colgate, loção pós-barba e pente de plástico verde. Temos sorte. Apesar de velhas, as portas não fazem ruídos.

Reparemos, agora, no carpete ocre e imundo. Sobre ele estão algumas partes de uma locomotiva de brinquedo. Deve ser dos anos oitenta. Vagões. Trilhos. E os trilhos são cinzas. Ele os derrubou levando uma caixa para o sotão.

Coisas sobre o amor passaram pela minha cabeça, agora. Sei que eu o amarei daqui a alguns minutos. Tenho certeza do que vamos encontrar. Sonhei com tudo isto e meus sonhos não mentem. Sei que estamos na casa certa. O número era nítido.

Estou ansiosa. Vamos direto à porta entreaberta, lá nos fundos. A porta está pintada de preto e é de madeira. Uma luz muito, muito fraca está saindo por ela. Sem fazer um som, eu a empurro... e voilá. Lá está ele, como eu imaginava.

TE APRESENTO O MEU AMOR.

O quarto está somente iluminado por uma vela e a vela está quase no fim, sobre a mesa. A mesa e a cadeira... lá no canto. Gavetas trancadas à chave. Papéis que parecem ser amarelos. Sem linhas, please. Um cigarro está aceso e o cheiro é excitante. O nanquim que ele insiste em usar... quase no fim.

Ele está de costas para mim, sentado na cadeira e parece escrever algo... céus... meu poeta.

Porém, antes de chegarmos perto dele para conhecermos o seu rosto, vou admirar um pouco a cama que, em breve, usaremos para esvaecer. Ah... nossos desejos. Nossas mais devassas fantasias... aos lados da cama não há coisa alguma além de roupas sujas e junk food da semana passada. Ela, digo a cama, cheira ao suor dele e agora, graças a mim, respira aliviada. Sabe dos sonhos que ele tem tido.

Chegou a hora. Começo a percebê-lo melhor. Ele tem cabelos pretos, brilhantes e ondulados. Veste calças de veludo roxo e os suspensórios caem quase até o chão. É magro, alto... posso ver o relevo construído pelos ossos dos seus ombros, braços... dos pés também. Ele é amaldiçoadamente branco e as poucas sardas das suas costas formam o desenho da contelação de Escorpião.

Ele larga a pena como se estivesse queimando os seus dedos e então leva as mãos à testa, deslizando-as pelos cabelos até à nuca. A aperta com desespero e força. Olha para o teto e se joga ao encosto da cadeira.

Já é o bastante. E para nós dois.

Enquanto eu chego mais perto, tu ficarás bem aí.

Agora ele pega a garrafa do líquido verde e toma mais um gole. Sinto o cheiro e fico aquecida. Encanto. Ele escuta os meus passos mas não se mexe. Paro ao lado dele. Acabo de avistar a navalha. Não imaginávamos. Sorrio.

- Demorastes!

- Não, não demorei.

Nesse momento ele abre o sorriso mais iluminado sem ao menos ter olhado em minha direção.

Continua olhando para a carta e a carta zomba dele, agora.

A rasga, com energia.

Nos olhamos.

Nos achamos.

Agora nos dê licença.



-26.01.2006-

sexta-feira, março 24, 2006

No caminho da farmácia

Num dia cheio de cores,
esbarrei num dos meus amores.
Ele estava molhado
e precisava ser secado.

Ele é sensível e fraco,
vive pegando resfriados
e teima recordar
dos meus dias passados.

Insisto e digo de novo
que andar nessas chuvas
faz dele um grande tolo.

Ele ri de mim e diz:
- Tenho que me molhar e
aprender sozinho a me curar.



-02/2006-

Boato

O aperto no peito não passou o dia inteiro. Não é a asma que sempre desejou ter para usar aquelas bombinhas legais. Ela sente vontade de agarrar cada moço-de-cabelos-e-olhos-pretos que passa pela sua frente. Como se fosse adiantar. Desse jeito, acho provável que ela não tenha mais solução.

- Veste toda roupa branca que tu tens, guria. Se não curar parecerá, ao menos, que estás preocupada em esconder tuas vergonhas.

Eu sei cada palavra dos pensamentos que ela anda tendo. E são nada bons. Engraçado, ela sempre foi uma menina santa, até já fez comunhão. Mas as vizinhas disseram que ela ainda não se confessou esse ano.

- Aquela pervertida...

Os meninos sonham em tê-la mas ela não percebe. E, como se fosse desaforo, fica dizendo a si mesma que é um inseto. Diz isto todo dia antes de dormir. Cega. Mateus a teve noite passada, em pensamentos. Se ela soubesse do seu interesse, por necessidade faria algo para se aproximar.Talvez calçaria sapatos vermelhos. Porém antes, teria que conhecê-lo. Ela, no fundo creio, ainda não está totalmente enlouquecida.

Eu vejo o esforço que em todos os sábados é feito para que consiga ficar em casa apenas lendo um romance, como se fosse um disfarce para esconder a neblina abaixo das suas saias. Uma pena ter sempre bom juízo.

Alguém melhor a dirá que o que está sofrendo é apenas consequência das idiotices que andou falando. O aperto no peito dela, como tu já deves ter notado, é só o ardente e sem futuro sentimento por Lucas, um estúpido, preso no ar dos pulmões.



-15.01.2006-

terça-feira, março 14, 2006

Tempo #2

A seu tempo, deixa o tempo passar...
um dia verá que já se foram
809 anos e
você continua flutuando no mesmo velho mar.
Somos tão parecidos que
isto chega a nos amedrontar.
Somos algo que as pessoas não parecem gostar.
Eu nem dou a mínima porque gosto de sonhar.
Mas estou cansada.
Estou cansada dessa casa parada,
desse quarto em branco e dessa luz acesa.
Digo que nisto não há beleza.
Estou cansada desse lápis, desse papel...
tudo bem sem finalidade no momento
apesar de serem o maior apoio para
meus dedos continuarem se mexendo.
Tento esquecer das estrelas que
ousei ver na noite passada
só para não me sentir mais apagada
nesse dia que percebi que no seu amor
eu cheguei um pouco atrasada.
Mas não me sinto culpada.
Então, meu caro, desista logo.
Venha a meu tempo e lhe mostrarei
que o que perdemos
até agora foi nada.



-05.02.2006-

O Plano

No mundo laranja
dos estranhos como nós
falamos falamos falamos
mas nunca ficamos a sós.

Bebendo e despencando
do jeito que gostamos,
odeio estar assim fazendo
rimas idiotas pelos cantos.

O plano era perfeito
um ciúme mui idealizado,
o sonho de me sentir melhor e
desejada por meu amado.

Foi mais uma idéia estúpida
nascida na minha nuca
que jamais curaria
a minha solidão maluca.

Pelo menos descobri que há
nesse mundo meio vazio
alguém assim como eu
um poeta nada sadio.



_______
Para Marcos e seu amigo imaginário, o Hwang.
-04.02.2006-

quinta-feira, março 09, 2006

Formigas

Todas - Ahhhhhhhhhhh!

- Desviem! Desviem!
- Meu grão de açúcar!
- Não teme?!
- Terei que voltar!

Todas - Oh nããããããããããão!

- Vai não!
- É ali no bueiro!
- Continua andando!
- Não... ouço o berreiro!

Todas - Nhinhaaaaaaaaaaa!

- Ai!

(Era aquela pessoa maluca andando pelo cordão da calçada, de novo)

sexta-feira, fevereiro 24, 2006

Inquilina

Sentada do meu lado
me fez sentir machucado
por todo o apego
que julguei ser errado.

Ela realmente é cruel
e em todo seu fel
eu jamais acreditei
por ser um infiel.

Nesse momento tão triste
gostaria de tê-la longe
pois pior não existe.

E meu peito agora sinto pequeno
pois nele nunca houve lugar
pra essa horrível solidão morar.

O teatro #4 (mímica)

Luvas brancas e toque falso.
Cadeiras juntas afastadas no mesmo espaço.
Algum vidro, nenhuma transparência, pouco som.
Lá está a barreira.
A maquiagem esmaecida que esconde a emoção.


segunda-feira, fevereiro 13, 2006

O Teatro

Nesse tempo frio,
cobertores seriam apenas
coadjuvantes
na noite de verão
morna
que estaria fazendo
se eu estivesse
ao lado
de meu amor.



-24.01.2006-

sexta-feira, fevereiro 10, 2006

Discrição

Suzana trabalhava numa sala pequena e saía, quase todos os dias, às dezesseis horas só para ver chegar aquele homem dos cabelos bonitos.
Pontualmente ele subia a escada com seu olhar já enterrado no chão, aonde sabia que os belos sapatos de Suzana estariam se estivesse com sorte.
Boa tarde.
Três beijos.
Hoje ele errou duas miras. Suzana ficou avermelhada e satisfeita com tamanha ousadia.
Amanhã ela o hipnotizará e ele irá chorar, parado, diante do seu vestido azul.
Cumplicidade dos olhos, mas não dos corações.



-20.01.2006-

2

No nada, branco.
Tu inteiro.
Eu sem... vazio.
(Por dentro)



-20.07.2005-